A decisão de deixar o trabalho por insatisfação ou busca por maior bem-estar ganhou as redes sociais. Nos EUA, onde a cultura de exposição é mais forte, jovens chegam a gravar seus pedidos de demissão ou transmiti-los ao vivo em redes sociais como o TikTok.
No Brasil, o fenômeno é outro: profissionais têm usado o LinkedIn, plataforma que conecta pessoas e empresas, para anunciar suas saídas expondo como motivo culturas organizacionais tóxicas.
Posts compartilhados na plataforma ilustram essa tendência. Em uma publicação recente, uma profissional narra sua experiência com um chefe que expressava sua frustração aos gritos, criando um clima tenso entre os trabalhadores. Ela tomou a iniciativa de pedir demissão e, ao comunicar o motivo, apontou o estilo de liderança agressivo como incompatível com suas expectativas:
“Se o respeito não está sendo servido, levante da mesa”, disse, revelando que saiu sem outra vaga em vista, mas determinada a não repetir um burnout.
Depois do quiet quitting — ou “demissão silenciosa”, a prática de fazer só o essencial no trabalho, fenômeno que ganhou as redes na pandemia —, começa a ganhar força o revenge quitting, a demissão com “vingança”, expondo o ex-empregador numa forma de protesto contra condições precárias ou insatisfatórias de trabalho.
A moda começou nos EUA. Em outubro de 2020, a americana Shana Blackwell, na época com 19 anos, anunciou que estava se demitindo da filial do Walmart em que trabalhava, usando o microfone do supermercado, em um vídeo que se tornou viral.
"Danem-se os gerentes, danem-se a empresa! Eu me demito, caramba!", exclamou Shana, após dois anos insuportáveis, nos quais disse ter sofrido assédio moral.
Sem querer, ela acabou lançando uma das maiores tendências da plataforma. Os vídeos com a hashtag # QuitMyJob ("Me demito", em inglês) viralizaram.
No Brasil, muitos brasileiros se apegam ao emprego pela necessidade. Mesmo assim, a abertura para falar sobre demissões está virando tendência no Brasil, algo que, segundo especialistas, não era comum.
Lucas Oggiam, diretor-executivo da consultoria Michael Page, acredita que a “demissão silenciosa” , mais do que o pedido de demissão por vingança, sempre aconteceu no Brasil em função do principal modelo de contratação formal.
Pedir demissão significa abrir mão de direitos trabalhistas como 13º salário proporcional, multa de 40% sobre o FGTS e o acesso ao seguro-desemprego, benefícios garantidos só com dispensa sem justa causa.
— As pessoas ficavam no emprego porque queriam os valores rescisórios. E o brasileiro precisa trabalhar. Historicamente, somos um país com inconsistências econômicas. Grande parte da população não se permite ficar sem trabalhar por um tempo.
Porém, o uso intenso de redes sociais — o Brasil é o terceiro maior usuário global — pode impulsionar o “revenge quitting”, elevando riscos para a reputação de empresas.
— Somos muito adeptos a redes sociais, e a chance de alguém insatisfeito expor isso publicamente é razoável — diz.
Oggiam lembra que o brasileiro já é naturalmente mais propenso a buscar novas oportunidades. O Índice de Confiança Robert Half aponta que 54% dos profissionais planejam trocar de emprego em 2025. Destes, 69% têm interesse em mudar de empresa na mesma área profissional e 31% desejam explorar um novo ramo.
Para Eliane Ramos, presidente da ABRH, a busca pelo bem-estar é um dos motores dessa tendência no mercado de trabalho.
— Cada vez mais os funcionários buscam equilíbrio entre vida pessoal e profissional, com um ambiente de respeito, onde se sinta parte de um propósito comum. Às vezes, o desmotivador não é o salário, mas a falta de reconhecimento ou espaço para crescer.
Ela alerta, porém, que expor publicamente os motivos de uma demissão exige cuidado. Em tempos de redes sociais, o profissional que compartilha sua experiência de desligamento no ambiente digital poderá ser lido por ex-colegas, pela empresa que deixou e até por potenciais empregadores no futuro.
— Isso pode impactar não só a empresa, mas a própria carreira da pessoa. Uma boa conversa na saída é essencial, assim como a autogestão do que se publica.
Skip the extension — just come straight here.
We’ve built a fast, permanent tool you can bookmark and use anytime.
Go To Paywall Unblock Tool